27/05/2020
Eu tinha 10 anos quando fui passar minhas férias na fazenda do Tio Juca. Eu gostava muito desse irmão da mamãe, porque ele nunca me tratava como idiota e me ouvia com a mesma atenção e respeito que tinha com os adultos. Havia uma coisa diferente nele, era divertido e gentil e, ao mesmo tempo, sério e firme.
Nunca vou me esquecer daquele verão; o que aconteceu iluminou minha vida inteira. Naquele tempo, as férias de fim de ano duravam três meses. Mas, para mim, pareciam tão curtas!
Era bem cedinho quando Tio Juca me acordou para ver o parto da cadela Rosinha, uma vira-lata doce como mel. Ela pariu cinco filhotes, cada um mais engraçado e bonitinho que o outro. Fiquei deslumbrado. Tio Juca me falou: “Tenho uma tarefa para você. Irá prestar atenção ao comportamento desses bichinhos e dar um nome para cada um deles baseado no que você percebeu”.
Tarefa mais gostosa impossível! Eu passava o dia inteiro brincando com eles...
Depois de um mês, Tio Juca me chamou para contar o que havia descoberto e o nome sugerido para cada um. Não tive nenhuma dificuldade: preguiçoso, medroso, bravo, mansinho, maluco.
Ele riu bastante e, concordando com os nomes, me explicou: “Da mesma maneira, ao observar as pessoas, você poderá captar o jeito de cada uma, como sente e como age no mundo. Assim, poderá compreendê-las e se adaptar aos seus relacionamentos ao longo da vida, sem perder tempo tentando modificar os outros. Quanto a você, seja diferente, livre de rótulos, sempre novo e imprevisível!”
Uma semana depois, o mesmo pomar que eu achava que conhecia tão bem revelou-se uma novidade para mim. Passeando com Tio Juca, ele comentou: “Este laranjal foi plantado ao mesmo tempo, na mesma área. Mas veja: alguns pés cresceram mais que outros e estão bem mais carregados de frutas. Receberam a mesma quantidade de chuva, vento e sol. Então, o que aconteceu? Por que algumas plantas se desenvolvem e outras não?”. Descascou umas laranjas maduras de pés diferentes e me deu para chupar. Umas eram doces e refrescantes e outras, muito azedas; umas cheias de suco e outras, quase secas.
Depois, ao passarmos pelo jardim, Tio Juca me chamou novamente a atenção. “Estas lindas plantas floridas estão ao lado de outras que nunca floresceram. Algumas aproveitam o máximo e outras têm muitas dificuldades. Já viu aqueles arbustinhos que brotam no meio de areia e pedras? A vida pode ser muito dura, ela não é igual para todo mundo.”
Fiquei pensando e me lembrei do colégio. Comentei: “Tenho alguns colegas que aprendem mais rápido que os outros. O professor é o mesmo e todos recebem a mesma matéria. Alguns são preguiçosos e há aqueles que se esforçam bastante, mas não conseguem acompanhar o ritmo dos demais”. – “É isso mesmo, ele concordou, sua comparação é perfeita. Sabendo disso, você poderá se desenvolver cada vez mais e melhor e ajudar os companheiros a fazer o mesmo. Compreenda, entretanto, que cada um tem seu destino, seu papel e seu valor no mundo. Nunca menospreze ninguém!”
Depois, olhando firmemente em meus olhos, ele disse umas palavras que jamais esqueci e que determinaram meu caminho na vida adulta:
“Sobrinho do meu coração, não cresça como uma árvore estéril. Cumpra o seu destino, viva a sua vida plenamente: cresça, floresça e frutifique o máximo que puder! Que suas flores sejam belas e perfumadas e que seus frutos sejam doces e refrescantes e sempre alimentem todos ao seu redor!”
Carmem Carvalho e Marian Bleier