20/12/2011
Conheço a Dona Obsessão. Já fui serva dela algumas vezes e muito intensamente. Isso significa que naqueles períodos elegi alguém para morar em quase todos os cantinhos da minha mente. Claro que se alguém num momento desses me perguntasse por que eu concedi todo esse território para um único Senhor eu diria que estava apaixonada, que era uma imposição do coração.
Acreditar que é algo da esfera do Amor é salvo conduto para não pensar em patologia, em exagero. Sofrer, ficar doente, matar, morrer por Amor... Uma categoria que aspira por indulgência ao ser julgada.
Gosto de reparar no momento em que alguém começa a pulsar e se destacar conquistando quase todo espaço dentro. Examinar esse momento dá muitas dicas do porquê daquela escolha. Quando encontrei pela primeira vez um dos meus objetos de obsessão, ele, ao perceber que eu estava indo embora, gritou lá de longe: “Ei, não vai, fica!”. O quê? Alguém reparou em mim... devo ter pensado.
Mal sabia ele o que estava causando. Fiquei e durante uns dois anos grudei meu olhar, pensamentos, devaneios nele. Era o tal do amor impossível e eu por minha vez fiz tudo o que era possível para também inviabilizá-lo. Afinal, naquele momento da minha vida eu estava tão confusa que dizia querer aquilo que não cabia de jeito nenhum na minha vidinha.
Minha sorte foi desconfiar da soberania do tal do Amor e fui em busca de tentar entender porque eu queria porque queria e não mais que queria alguém tão inviável. O que ele tinha?
Quais eram seus atributos que me fascinavam e que depois descobri moravam em mim sem que eu me achasse capaz de exercê-los? Naquele caso era algo relacionado ao trabalho e ele acabou por ser meu mestre nessa área.
Uma pergunta que aprendi que se deve fazer nesses casos é: “No que eu estaria pensando se não estivesse pensando nessa pessoa?” Uhm... no meu cotidiano atolado pelo cuidar de crianças pequenas? No meu trabalho que não satisfazia naquela época?
Leio que um bom ingrediente para ajudar a se estabelecer uma obsessão é “um jogo de vaivém, de solicitude e de desdém, de presença e ausência. O ritmo desta técnica atua como uma máquina pneumática na atenção do apaixonado e acaba por esvaziá-lo do resto do mundo” (Ortega y Gasset).
Claro que a pessoa por quem me apaixonei tinha lá também suas necessidades mal conhecidas que o prendiam, por sua vez, naquele jogo. Prisão é a palavra. Ainda hoje me surpreendo com a quantidade de pessoas e possibilidades que há no mundo e como naquela época eu só tinha olhos para aquela única forma que parecia tão especial.
E era mesmo! Mas não só por seus atributos que no fundo ele divide com tantos outros seres humanos e sim porque coloquei na mão dele (sem pedir permissão!) o fio que podia me levar para dentro do meu labirinto. Entrei e descobri tantas coisas sobre mim.
A principal delas é que há, como no mito do Teseu e do Minotauro, um monstro ali que eu vou chamar de Outro Eu. Alguém que fala mal de mim o tempo todo, que me diz que eu não devia ter falado ou feito isso ou aquilo. Alguém que quero muito impressionar, apesar de estar convicta de que ele nunca vai me dar crédito.
Coloquei esse Outro Eu para morar no corpo daquele moço naquela época e eu o coloco ainda hoje aqui e ali. Sempre para me dizer que estou gorda, inadequada, que essa crônica não está boa, que aquela pessoa ali que é interessante, que eu deveria estar vivendo uma outra vida muito mais excitante...
Enfim: cisão! Eu contra eu. Quanta energia se vai aí... O bom é que já conheço esse labirinto e já me sentei várias vezes para negociar necessidades com meu Minotauro. Aliás, agora no verão, comprei um belo biquini para ele e vamos Eu e Eu para a praia mergulhar no Oceano e assim treinar se entregar para algo que é muito maior. Aprender a ser Um?