03/11/2005
Tem um causo que envolve um querido padre lá da minha terra, o Padre Mário. Italiano de um carisma sem par, chegando até a cativar meu velho pai, o sêo Amadeu, que tinha mania de ser ateu.
Mas, vamos ao dito causo, começando por dizer que havia um menino de uns 10 anos de idade que era apaixonado por sua bicicleta colorida. E, naquele fatídico dia, o menino rodava no pátio que existia bem à frente da matriz. Fazia visagem, andava numa roda só, empinava, rodopiava. Enfim: fazia miséria com a dita cuja bicicleta, pra alegria de quem passava por ali.
Eis que de repente surge, não se sabe donde, um carro de praça (táxi), atinge o menino em cheio, atirando-o longe, e passa com o tal carro por cima da querida bicicletinha dele.
Graças a Deus o menino não levou mais do que um galo na testa e um arranhãozinho de merda numa das pernas. Mas a tal bicicletinha colorida, naquele momento já era. As rodas fizeram um oito, o guidão entortou, os raios das rodinhas quebraram-se todos...enfim, como eu disse: já era.
O menino, ao verificar o estrago na sua querida bicicletinha, sentou-se na escadaria da igreja e pôs-se a chorar alto e a resmungar desesperado.
MENINO – Ai meu Deus do céu... eu perdi ela...que que eu faço agora? Eu que gostava tanto dela. Ai meu Deus do céu (E chora.)
Nesse momento, eis que um enterro surge de dentro da igreja. Era o enterro de uma velhinha... bem velhinha mesmo. Coisa de uns 90 e tantos janeiros, como lá diz o outro. E o dito enterro vinha acompanhado por bastante gente, inclusive pelo Padre Mario, que é a figura carismática e bondosa de quem eu falei no começo deste causo.
Ao passar pelo garotinho que chorava desesperado e lamentava sua perda (``...ai ...ai eu perdi ela...´´, etc. e tal) o Padre Mário achou que devia consolar aquele menininho, pois relacionou a velhinha morta com o choro do menino, pensando lá com ele que talvez fosse uma avozinha querida.
PADRE – Não chore, não, meu filho. Deus sabe muito bem o que faz.
MENINO – (choroso e até meio revoltado) – Sabe nada, sêo padre. Eu perdi ela, que era a coisa que eu mais gostava. Cumé que eu vou vivê sem ela agora?
PADRE – Calma, meu filhinho. Todos nós temos a nossa hora.
MENINO (choroso) – Mas eu num sei vivê sem ela. Sempre quando eu ia dormir eu dava um beijo nela. Eu ia comer, antes tinha de dar um beijo nela, de tanto que eu gostava dela. Ai meu Deus do céu...agora eu perdi ela... ( E chora).
Nessas alturas, o enterro já ia longe e nada de o Padre Mário consolar aquela criaturinha pela sua perda.
PADRE (já meio sem paciência com o menino, tenta uma última palavra de consolo) - -Filho, de mais a mais, você tem que entender que ela já estava bem velhinha mesmo...É ou não é?
MENINO (arremata, pra espanto do sêo vigário) – É...mas a rodinha de trás ainda tava boa....