14/08/2014
Você já ouviu falar da uva El Pais? Sempre quando acordo a primeira coisa que faço é ir à cozinha, pegar o jornal que chegou e dar uma breve lida nas principais notícias. Além disso, gosto de ver matérias sobre o tal falado e atual tema da sustentabilidade. Bom, toda quinta-feira no jornal que assino, tem um caderno sobre comidas e bebidas em geral e hoje me deparei com uma matéria com o seguinte título: "Vinhos de alma, vinhos orgânicos, biodinâmicos e naturais". Fiquei tão feliz que somente aquela reportagem me fez ganhar o dia. Parece que não sou uma das únicas lutadoras para persuadir as pessoas sobre esta nova forma de beber esta bebida tão divina.
Lendo na parte que explicava sobre vinhos naturais, ou seja, produzidos de forma organicamente e sem conservantes, o que chamamos de SO2, parei meu olhar em um vinho chamado Louis Antonie Luyt Uso de Pilem 2010, R$ 96,00. Nome estranho não é mesmo? A uva nem se fala: El País. O vinho é 100% natural, com um forte gás residual, que se sente no nariz e na boca. Um vinho com uma fruta muito madura, como falou Lis Cereja, colega de trabalho que possui uma loja e restaurante natureba no Itaim Bibi: “Parece que você passou a língua em uma cela de cavalo”. Que horror!!! Um vinho para amá-lo ou deixá-lo. Eu também gostei.
E a uva El País? El país foi uma uva levada ao Chile pelos imigrantes espanhóis e, por mais de um século, foi esquecida pelos enólogos e rebaixada ao status de dar origem a vinhos de quinta categoria. E, quem neste cenário sombrio, teria coragem de tirar a El País de seu calvário? Muitos produtores renomados estão fazendo ótimos vinhos com esta uva. Uma uva muito aromática e que produz vinhos sedosos e fáceis de tomar.
Existe um movimento no Chile dos produtores de vinhos naturais. O grupo se autonomeou “Chanchos Deslenguados” (algo como “porcos sem língua”). Sebastián Alvear, o organizador do evento e proprietário de uma pequena distribuidora em que se pode conseguir alguns desses vinhos (www.vinonatural.cl), conta que a ideia de agrupar todos para se apresentarem em público foi mostrar vinhos diferentes dos demais. “Vinhos arriscados, sem tabu”, disse.
Trata-se, com certeza, de um grupo díspar em termos de visão sobre o vinho. Desde produtores muito artesanais, como González Bastías, um pequeno produtor que faz quantidades mínimas da cepa El País ou Moscatel Negro, passando por produtores consagrados e que já estão há décadas na cena chilena, como Villard, até iconoclastas que impulsionaram a ideia de fazer vinhos diferentes e de costas para o mercado, como o francês Louis-Antoine Luyt – a quem se deve, no Chile, o redescobrimento da casta El País, a mesma que trouxeram os conquistadores espanhóis para a América e que, por séculos, foi uma uva esquecida, relegada a vinhos de baixíssima categoria.
É precisamente o francês Luyt a alma desse movimento e foi ele quem levou seus membros a mostrar o que fazem em eventos como o do “Chanchos Deslenguados”. E também é Luyt o pioneiro em um tema como o dos vinhos naturais, assunto de que pouco ou nada se falava no Chile antes de sua chegada, na segunda metade da década passada. Luyt trabalha com uma liberdade pouco usual no meio chileno. Seus vinhos, várias cuvées de vinhedos distintos e feitos com a El País, como também seus Carignan e seus Pinot, encontram-se entre os mais singulares (e saborosos) que se podem degustar no Chile.
Vale uma dica diferente!
Santé!
Carolina Escobar é sommelier formada pela ABS - Associação Brasileira de Sommeliers. Trabalha como consultora e avaliadora de vinhos. É também formada em Marketing pela ESPM - Escola Superior de Propaganda e Marketing. Atua com comercialização de vinhos orgânicos na Granja Viana.
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