Juscelino Kubitschek |
Juscelino Kubitschek, “o peixe vivo” de Minas governou durante a melhor época que minha geração viveu neste país: os anos dourados. Parecia que o país vivia em festa. Durante seu governo passei um mês em Copacabana, na casa de uma amiga de meus pais.
Nas ruas do Rio eu me encantava com a alegria das pessoas. Algumas ao passar em frente a uma loja de som começavam a dançar na calçada. Era visível a felicidade que havia no Brasil. As pessoas jamais imaginavam que dali a alguns anos o país viveria sob um clima cinza, de chumbo.
Adolescente, eu me deslumbrava ao ver os pés descalços do presidente nas fotos que as revistas “Manchete”, “Fatos e Fotos” e outras publicavam. Só hoje sabemos que aqueles “cinqüenta anos em cinco” que JK pregava custaram ao Brasil, na época, um crescimento de 40% da dívida externa além de ver a inflação dobrar.
Mas esses problemas passavam ao largo de nossas vidas e em nossos momentos românticos os assuntos giravam em torno da bossa-nova, recém surgida, ouvindo “Desafinado” na voz de João Gilberto ou “Eu e a brisa” com Johnny Alf”, ou o Barquinho na voz de Nara, para a voz de quem, nos parecia, a bossa-nova fora criada.
E nos momentos de agito a loucura era total com o rock and roll de Elvis Presley. A juventude enlouquecia com o requebrado negro e alucinante do cantor. As mocinhas tingiam os cabelos de loiro e usavam batom rosa lilás com contorno à la Brigitte Bardot, e os homens se encantavam com as duas polegadas a mais de Martha Rocha e vibravam com a Copa do Mundo.
Mas de tudo que aconteceu no governo JK, o que mais marcou aqueles anos dourados foi o início da construção de Brasília, por ele chamada de “a capital da esperança”. A idéia da fundação da capital do Brasil em Goiás foi decidida no primeiro comício da campanha de Juscelino à presidência, quando uma pessoa perguntou a ele se cumpriria o artigo 4o. das Disposições Transitórias da Constituição brasileira que tratava da fundação da capital do Brasil no planalto Central.
Construção de Brasília, 1959. Foto - Luiz Carlos Barreto |
Juscelino era rapidíssimo, inquieto, famoso por estar sempre agitado e foi assim que num repente, sem grandes reflexões, ou em uma reflexão rapidíssima, respondeu que sim. Plantava-se ali a semente do que seria a capital da esperança. A cidade que rompeu com a arquitetura de milhares de anos.
Juscelino era uma presença que parecia estar sempre alegre, feliz, agradável de ver e de se ouvir. Transitava com a mesma desenvoltura entre intelectuais, artistas, desportistas e o povo simples que construiu Brasília.
Chamado de presidente bossa-nova era alvo constante dos humoristas da época, e até de uma canção de Juca Chaves. Nem tudo, no entanto correu às mil maravilhas no seu governo.
Mas embora tenha enfrentado alguns problemas como a greve geral de quatrocentos trabalhadores em 1957, da inflação que cresceu muito em seu governo, ele rompeu com o FMI em 1959.
E para atestar o momento feliz que vivíamos, data de 1956, durante seu governo, o lançamento do romance considerado a maior dentre as obras literárias brasileiras: “Grande Sertão: veredas”, de outro mineiro tão ousado quanto ele: Guimarães Rosa.
Foi lamentável ver esse homem de quem as pessoas em geral só têm lembranças agradáveis, não ter podido entrar livremente na cidade que fundou. Durante a ditadura militar poucos anos antes de morrer, entrou em Brasília dentro de um caminhão, agachado, para não ser visto.
Sedutor, Juscelino despertou paixões verdadeiras e platônicas nas mocinhas de então, e é triste lembrar, nesse aniversário de 50 anos de Brasília, que o “o peixe vivo”, morreu no asfalto escaldante da via Dutra, em um acidente que ainda hoje desperta suspeitas.
Risomar Fasanaro
| Pernambucana, veio para Osasco com 11 anos. Jornalista, professora de Literatura Brasileira e Portuguesa e escritora, autora de "Eu: primeira pessoa, singular", obra vencedora do Prêmio Teresa Martin de Literatura em júri composto por Ignácio de Loyola Brandão, Deonísio da Silva e José Louzeiro. Militante contra a última ditadura militar no Brasil. |