26/09/2005
Este, meu caro leitor, é mais um texto escrito por mim. Nenhuma novidade, a não ser pelo fato de que ele foi escrito da casa dos meus avós. Mais especificamente do lap top que meu avô acaba de adquirir. Para alguém que não consegue nem ligar o celular, a compra de um computador pode ser considerada um passo muito além das pernas. Mas se a tecnologia está para nós, aqui estamos nós para ela. E isso inclui o meu avô. Ele se esforça, mas a realidade é que a internet está aquém de seus conhecimentos. Ou será que ela que está longe de se igualar ao meu avô? Enfim, o computador que antes para ele era algo desconhecido, agora continua incógnito, mas pelo menos já faz parte do seu dia-a-dia.
A única coisa que ele sabe é que não sabe nada. Hora ou outra o telefone lá de casa toca. Minha função de neto foi deletada, me sinto como um assistente técnico 24 horas. Não existe conversa de almoço de domingo que não termine em plantão de dúvidas. O mundo dos e-mails é assustador, me perguntou outro dia como o carteiro coloca tudo dentro do computador dele. Garoto novo meu avô! Toda experiência de 78 anos se converte na ingenuidade de uma criança que acaba de descobrir que há vida lá fora. A fase dos ‘por quês’ está de volta. A psicologia infantil é bem vinda, mas ao contrário dos pimpolhos, ele parece se contentar como um ‘porque sim’ sem paciência. Se não se contenta, pelo menos aceita. Como explicar que ele pode ler as notícias da Espanha ao mesmo tempo em que o jornal é entregue de porta em porta em Barcelona é tarefa de filha. Até minha mãe, uma estranha no ninho tecnológico, está nas condições de ensinar.
O fato é que o computador virou o centro das atenções. Como se fosse um membro da família, tem até lugar marcado na mesa. Meu avô se refere ao lap top como ‘ele’, uma força superior a quem se submete todos os dias. ‘Ele’ falou, está falado. É agora quem dá a última palavra. Eu vejo respeito nos olhos dele, o ritual de iniciação é feito em silêncio, esperando atentamente pelo próximo passo que ‘ele’ exigirá. Sinto que a relação está evoluindo para níveis superiores, mas o processo é lento. Como qualquer casal, as brigas são inevitáveis, mas depois de 3 meses de flertes e namoricos, a admiração chega a ser recíproca. O casamento está longe de ser um sucesso, mas o divórcio está fora de questão. Pelo menos por enquanto, já que meu avô acaba de ganhar um DVD portátil.
O clima de ciúmes está no ar e no meio dessas disputas todas está minha avó. Alguém que meu avô também está longe de entender, mas que sabe perfeitamente que, pode vir a modernidade que for, nenhuma delas suportará e amará por 48 anos um homem que veio direto do outro lado do oceano sem manual de instrução algum.