14/03/2025
Mauricio Orth
Em um breve histórico, Cotia aprovou em 2022 duas leis alterando o plano diretor e as determinações de uso e ocupação de solo. Essas leis foram contestadas pelo MP por sua inconstitucionalidade, devido à ausência de consulta pública. Após negociações entre a prefeitura e o MP, as leis foram reeditadas em 2024 e interpretadas novamente pelo MP como inconstitucionais. O Tribunal de Justiça de São Paulo acatou a denúncia do MP e suspendeu tanto as leis de 2024 como as de 2022.
A princípio, pela lei, valeriam as anteriores, de 2008, mas Cotia hoje está parada. Quaisquer procedimentos burocráticos que envolvam minimamente a questão imobiliária, desde uma simples troca de titularidade e cadastro no município, aprovação de residências unifamiliares, Habite-se, Desdobro, Licenças de Funcionamento e Operação etc., nada está sendo aprovado.
Recado à pessoa empreendedora
E os negócios? Como fazer?
O Site da Granja conversou com Ricardo Monteiro, Secretário adjunto de Indústria, Comércio e Empreendedorismo:
“Uma orientação que a gente tem passado para as pessoas é a de protocolar os seus respectivos pedidos. É um protocolo que não garante o direito, mas assegura que o processo está sendo observado, sob a perspectiva de aguardar a efetiva resposta do poder público, que acredito, restabeleça a plena normalidade de todos os licenciamentos num curto prazo de tempo.”
SG - E se mesmo com o protocolo, o empreendimento for considerado inválido pelas novas diretrizes? Por exemplo, se o empreendimento comercial for aberto em um endereço onde só serão permitidas residências, como fazer?
RM - O tratamento desta questão quem vai dar é a decisão contida no julgamento da Ação Civil pública interposta pelo MP. Aquilo que não puder ser tolerado deverá ser objeto de análise pontual. A dúvida é totalmente pertinente e fica sem resposta. A resposta quem trará é o poder judiciário.”
Parou por quê?
Nesse aspecto, Cotia está parada. A Secretaria de Assuntos Jurídicos da cidade achou melhor determinar a suspensão dos licenciamentos em função da decisão judicial que suspendeu as alterações do plano diretor. Trata-se portanto de uma interpretação proveniente dos integrantes desta Secretaria.
Este é o ponto no qual o manifesto do MDGV - Movimento Defesa Granja Viana, lançado recentemente se baseia:
“A Prefeitura adotou medidas que alguns já denominam 'sabotagem administrativa'. Incapaz de continuar favorecendo, de forma velada, os lucros ilícitos provenientes da autorização de prédios e comércios clandestinos em áreas estritamente residenciais, a administração municipal suspendeu a abertura de empresas, a renovação de licenças, atualizações cadastrais (CNPJ), alvarás de construção em toda a cidade. A justificativa? Uma suposta ‘insegurança jurídica’ decorrente da ausência de um zoneamento válido.”
Seria uma forma de pressão? Segundo o manifesto do MDGV, sim:
“Essa manobra aparentemente não passa de uma estratégia articulada por remanescentes da antiga gestão para ludibriar o atual prefeito e o Ministério Público. A estratégia foi criada não só para forçar e manter a aprovação indiscriminada de milhares de alvarás e licenças como também para pressionar uma decisão favorável à legalização dos desmandos cometidos nos últimos anos.”
A posição da Prefeitura sobre o que já foi aprovado
Após a suspensão, a Prefeitura enviou, através da Secretaria de Assuntos Jurídicos, dois embargos de declaração ao TJSP, ambos assinados pelo prefeito Welington Formiga: O primeiro de 29/01 perguntava se a decisão também abrangia as leis de 2022, o que o TJSP respondeu que sim, que estavam suspensas tanto as leis de 2024 quanto as de 2022.
No segundo, de 06/03 (quarta-feira passada), a prefeitura declara que acata a decisão sobre a invalidação das leis, mas pondera que o que foi aprovado deve assim permanecer. Esse documento termina assim:
“....A única ressalva a se fazer é a manutenção daquilo que já foi realizado. O desfazimento de empreendimentos já em construção, em renovação, ou qualquer outro praticado deve respeitar o ato administrativo perfeito (um ato administrativo é considerado perfeito quando todas as etapas necessárias para a sua produção foram concluídas - N. da E.), sob pena de causar um prejuízo sem tamanho à municipalidade, que pode vir a ser demandada pelos interessados nos empreendimentos já iniciados. Desta maneira, nos termos do acima defendido, defende-se o parcial acolhimentos dos embargos de declaração, com fundamento no exposto neste arrazoado.”
Caio Portugal, Presidente da AELO - Associação das Empresas de Loteamento e Desenvolvimento Urbano, Vice-Presidente de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do SECOVI/SP e Presidente de empresa loteadora com mais de 70 empreendimentos realizados, segue por outro caminho, mas chega ao mesmo lugar:
“A decisão do TJSP em favor do MP não modulou os efeitos. Portanto, se a intenção é barrar a verticalização, que a decisão deixe claro esse aspecto. Ao colocar tudo no mesmo "balaio", travou aqueles que respeitam a Lei e fazem de forma regular. A decisão está favorecendo a quem? Aos que fazem loteamentos clandestinos, irregulares etc.”
SG - Existem versões que afirmam que a falta de modulação foi eventualmente aproveitada por grupos internos da prefeitura, interessados na pressão causada para que a condição "ex-tunc" não seja aplicada, ou seja, para que as autorizações expedidas em bases consideradas inconstitucionais passem a valer. O senhor acredita nessa possibilidade?
CP - “Sim. Ocorre que esses efeitos prejudicam a sociedade como um todo, e não a discussão sobre a verticalização, que é o dissenso. Processos triviais, como abertura de atividades residenciais ou comerciais, habite-se, alvarás de edificação unifamiliares estão sendo prejudicados. Esse é o equívoco.
SG - Seria um equívoco provocado? A prefeitura não poderia, por exemplo, destacar uma força-tarefa para analisar caso a caso e "separar o joio do trigo", isto é, liberar para análise e decorrente aprovação os processos que evidentemente nada tem a ver com as leis em discussão?
CP – Sim, poderia, e até mesmo entrar jurisdicionalmente e solicitar a separação dos casos.
Falta de proatividade
De fato, após a suspensão, a prefeitura enviou dois ofícios ao TJSP. Um pedia esclarecimentos sobre a decisão e o outro manifestava sua posição contrária ao efeito “Ex-tunc” (que retroage as autorizações já dadas). Nos dois documentos não se encontram manifestações de interesse em se buscar soluções para que Cotia recupere da forma mais rápida possível um mínimo de normalidade.
“Quanto tempo mais a população terá que esperar para que a cidade tenha um planejamento urbano legítimo e adequado?” diz o manifesto do MDGV.