14/02/2025
Quem não sentiu nos últimos tempos um aperto no peito ao ouvir as notícias do dia? Resultados de eleições mundo afora, crises econômicas, tensões geopolíticas, cada manchete pode soar como um novo alerta, trazendo preocupações, frustração e muito desânimo.
Para quem está mais atento ao mundo
e às engrenagens que nos regem pode ser paralisante. Diante do peso da
realidade, o impulso de lutar muitas vezes dá lugar à desesperança e à sensação
de impotência, que, por sua vez, é solo fértil para o medo.
Então, como seguir vivendo sem se
sobrecarregar a ponto de perder a capacidade de agir, mas também sem cair na
inconsciência e na negação?
O medo é uma reação primária,
esculpida em nossa biologia para garantir a sobrevivência. Diante de uma
ameaça, nosso corpo se prepara para lutar, fugir ou, em alguns casos, congelar.
Essa resposta, que foi essencial para nossos ancestrais lidarem com predadores
e perigos físicos, hoje se manifesta também diante de ameaças mais abstratas —
o colapso climático, instabilidades políticas, crises econômicas.
Com a hiperconectividade atual, essa
sensação se intensifica. As notícias chegam a nós em tempo real, muitas vezes
sem filtros, misturando fatos e opiniões diversas e disposições emocionais
exacerbadas. O resultado é um estado constante de inquietação que se instala no
cotidiano.
Se, para alguns, a ignorância pode
se apresentar como uma proteção, para quem escolhe seguir atento, o mundo deixa
de aparecer como um lugar seguro. A hiperconsciência dos problemas globais e as
possíveis implicações dos eventos econômicos, políticos e sociais faz o medo se
tornar crônico. Esse estado pode levar a situações como a "paralisia da
análise", na qual o excesso de informação bloqueia qualquer ação, ou à "fadiga
de combate", que esgota aqueles que tentam resistir incansavelmente.
Se há algo que a história nos
ensina, porém, é que o medo e o ódio são ferramentas eficazes de controle
social. Governantes autoritários e grupos extremistas sabem que uma população
paralisada pela angústia ou tomada pela revolta desordenada é menos propensa a
reagir de forma eficaz. Esses estados, ao invés de promoverem mudanças reais,
apenas reforçam o ciclo de exaustão e desgaste.
Diante disso, o primeiro passo é
reconhecer o jogo e não se deixar capturar por ele. O medo pode ser um sinal de
alerta legítimo, mas não deve nos impedir de agir.
Assim, algumas estratégias podem
ajudar a evitar que a carga emocional excessiva e improdutiva se instale:
- Filtrar
as informações: Não é necessário consumir tudo o
tempo todo. Escolher fontes confiáveis e estabelecer limites para o fluxo de
notícias, segundo, inclusive, a própria capacidade de ação, ajuda a manter a
lucidez sem cair na alienação.
- Transformar
angústia em ação: O desespero imobiliza, mas a ação,
mesmo que pequena, reorganiza a percepção das nossas capacidades e força. Esta
é a primeira medida diante de situações potencialmente traumáticas: começar a
reorganizar o mundo que se desestruturou para restabelecer, aos poucos, a confiança
em si e na vida, a alegria e a esperança. Assim, engajar-se em projetos locais,
criar redes de apoio e fortalecer laços comunitários são formas concretas de
contrariar a sensação de impotência.
- Reconhecer
os ciclos da história: As crises parecem definitivas
quando estamos imersos nelas, mas ciclos se fecham e sempre há espaço para a
reconstrução.
- Cuidar
da saúde emocional: O mundo precisa de pessoas lúcidas
e equilibradas para transformá-lo. Assim, pausas e tempo voltado para o
autocuidado, incluindo aí práticas como meditação, atividades físicas e mesmo o
lazer, são essenciais para evitar o esgotamento mental e recuperar forças para
seguir.
É importante perceber ainda se
questões mais profundas não estão se aproveitando do momento sensível e de
justificativas externas para se manifestar. Muitas vezes, a paralisia diante do
mundo está ligada a medos pessoais que já atuavam, mas de maneira mais sutil.
Por exemplo, há quem sempre tenha
desejado mudar de país, iniciar um novo projeto ou dar um grande passo na vida,
mas que frequentemente também encontre barreiras que parecem intransponíveis. O
cenário externo, com suas crises e incertezas, pode oferecer justificativas
perfeitas para o adiamento indefinido. Uma crise econômica, a pandemia, uma
possível nova ameaça global — a cada fase, um novo motivo surge para justificar
a imobilidade. Quando uma razão deixa de ser um obstáculo, outra rapidamente se
coloca em seu lugar, sustentando um ciclo de postergação indefinido, baseado,
na verdade, em medos pessoais profundos que não são reconhecidos.
Com tudo isso, vale lembrar que o
próprio ato de não se dobrar ao medo já é um gesto de resistência. O que nos
ameaça quer nos ver exaustos e isolados, mas quando criamos conexões e seguimos
na construção de algo novo, geramos transformação e fortalecimento, tanto
pessoal quanto coletivo.
Reconhecendo os nossos próprios
medos e como eles se entrelaçam com as crises do mundo, percebendo que muitas
barreiras são projeções internas, ganhamos mais liberdade para agir e
interpretar a realidade de forma lúcida, encarando de frente e por completo os
desafios que se apresentam e também enxergando além deles.
Se no céu surgem tempestades, é
preciso lembrar que há frestas de sol entre as nuvens. Se há brutalidade,
também há gestos de coragem e solidariedade que se espalham mundo afora. Ver as
flores no caminho é essencial. E definitivamente isso não significa negar as
pedras, mas lembrar que elas não são tudo o que há.