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Conexões Humanas e Saúde Mental

A falsa vida perfeita das redes sociais e o impacto na sociedade

06/03/2025



Desde o início dos anos 2000, a sociedade convive com o fenômeno das redes sociais. Anteriormente, os espaços virtuais eram mais frequentados por jovens e adolescentes, que postavam fotos esporádicas. Na época, os álbuns virtuais eram apenas uma versão atualizada dos álbuns físicos, onde colocávamos imagens de momentos especiais para compartilhar com pessoas significativas em nossas vidas.


Atualmente, a grande maioria das pessoas, de todas as faixas etárias, tem um perfil ativo, e uma simples ida a um café vira um storie. Até porque, o próprio estabelecimento já se prepara para isso, com seu ambiente “Instagramável”. E assim, sem perceber, a sociedade vive em um clássico efeito manada, ou comportamento de rebanho — algo que Freud já descrevia lá em 1920, em Psicologia das Massas e Análise do Eu. O curioso é que parece que esquecemos de viver no “mundo real” para habitar esse universo paralelo das redes sociais, onde a aparência, os lugares que frequentamos e o que fazemos tornam-se mais importantes do que quem realmente somos. E eu me pergunto: será que essa vida de aparências traz, de fato, alguma felicidade para o ser humano?

 

Em uma reunião na Sociedade Brasileira de Filosofia e Psicanálise, eu e outros psicanalistas discutíamos justamente esse fenômeno das redes sociais. E, como era de se esperar, chegamos à conclusão de que a sociedade atual tem apresentado, cada vez mais, traços de uma Personalidade Narcisista coletiva. Não é por acaso que esse termo virou moda na internet.

 

Entre as características dessa estrutura de personalidade, estão a necessidade incessante de aprovação, admiração e uma vontade quase infantil de se sentir superior aos outros. Alguma semelhança com o que vemos por aí?

 

Hoje em dia, é comum que algumas pessoas tirem férias não exatamente para relaxar ou aproveitar o destino, mas para fazer um verdadeiro ensaio fotográfico e colecionar curtidas e elogios. Afinal, é preciso mostrar para o resto da sociedade o quanto sua vida é perfeita. E não são só as férias que são impecáveis — o dia a dia também precisa parecer maravilhoso. Eu tenho o melhor namorado, o melhor emprego, uso roupas de grife (mesmo que algumas sejam falsificadas) e, claro, frequento os melhores lugares que o dinheiro pode pagar (ou o cartão de crédito, no caso).

 

A contradição, porém, é escancarada no consultório psicanalítico. Você acredita que esses mesmos indivíduos com “vidas perfeitas” nas redes sociais, muitas vezes, têm uma vida real absolutamente caótica? Dívidas impagáveis, casamentos disfuncionais, jornadas de trabalho exaustivas que flertam com o burnout e uma desconexão quase total com os próprios filhos.

 

Essa busca desenfreada por aprovação externa nada mais é do que uma tentativa desesperada de preencher um vazio interno. E o mais triste é perceber que, para ser aceito em algumas bolhas sociais, não importa tanto seu caráter, suas ideias ou seu valor ético e moral — o que conta é o que você tem, ostenta e aparenta ser.

 

Também não são raras as pessoas que chegam ao consultório profundamente infelizes por não terem a beleza, o corpo ou a vida que colegas, amigos ou influenciadores dizem ter. É como se houvesse uma pressão invisível — e cruel — que tenta nos convencer de que dinheiro compra classe, educação e elegância. Quando, na verdade, são a família, a educação e a convivência social que moldam valores éticos e morais — e isso independe da conta bancária.

 

Não se iluda: a felicidade não está no que é material. E lembre-se: nas redes sociais, todo mundo só mostra o que quer mostrar. NINGUÉM TEM UMA VIDA PERFEITA. Todos nós temos nossos leões diários para enfrentar. Você não é o único passando por dificuldades, apesar de a timeline te fazer acreditar nisso.

 

Se você está vivendo um momento difícil, lembre-se da frase de Sêneca: “Toda a felicidade é incerta e instável”. E por mais que alguns insistam em mostrar uma vida de comercial de margarina, a realidade é como uma roda gigante — altos e baixos fazem parte do pacote, e o pior é que esses momentos não avisam quando vão chegar.

 

Não reprima seus sentimentos e passe por esse momento da maneira que fizer mais sentido para você. Não existe receita de bolo. E se tudo estiver pesado demais, procure ajuda. Terapia não é sinal de fraqueza. Pelo contrário — é sinal de coragem e luta.


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Fabiana Scremin

Psicanalista Clínica com capacitação em Psicotraumatologia, Historiadora pela PUC-SP. Membro do Conselho Nacional de Psicanálise e da Associação Nacional de História.

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