28/08/2008
Você já deve ter ouvido falar mil vezes sobre “poder pessoal”. Não tenho bem certeza, mas a idéia de que a individualidade encerra poder é muito antiga — ancestral — e foi retomada inicialmente, nos tempos atuais (quer dizer, desde que eu me entendo por gente...), na década de sessenta, na contracultura e visão de mundo californianas. Carlos Castañeda (êta fundo do baú!) também falou nisso, naqueles idos.
Tenho verdadeiro horror a tudo que é “new-age”, no sentido de propor utopias irrealizáveis, uma atitude de amor que é superficial na sua universalidade, e justamente deixa de olhar para os conflitos pessoais e coletivos que, uma vez liberados, trazem a almejada felicidade e poder pessoais e coletivos. É fuga pura e simples. Falou-se muito em poder pessoal nessas esferas diáfanas e, no fundo, tristes, do pessoal que foi para as drogas, para o mato, e não voltou.
Mas há uma idéia de poder pessoal que nos últimos tempos tem me chamado a atenção interiormente. É justamente essa, que citei, oriunda do movimento contracultural dos anos sessenta, que se materializou em seu aspecto mais desenvolvido e profundo em algumas obras de psicólogos importantes, como Maslow, Perls (da Gestalt-Terapia), Schultz e outros da época. Vários deles trabalharam e viveram algum período em um centro de atividades fantástico chamado Esalen — talvez o centro desse tipo mais importante do mundo, ao lado de Findhorn, na Escócia. Esalen é uma propriedade à beira do mar gelado de Big Sur, na Califórnia, praticamente eqüidistante de São Francisco e Los Angeles. Imagine uma falésia dando para o Pacífico, onde o sol se põe e as baleias passam ao largo; sobre essa falésia fica a propriedade, onde há casas, chalés, salas de trabalho e demais instalações e refeitórios do centro. Nesse local há cursos de praticamente todas as práticas importantes da psicologia, todas as linhas, de trabalhos corporais, massagem, rolfing, etc. Descendo um pouco na ribanceira da falésia há fontes de água termal quente, que são recolhidas em grandes banheiras a céu aberto, os hot tubs, para cinco ou seis pessoas. No início ou no final do dia, você se senta lá, nessa água muito quente vinda direta da montanha, e fica olhando o mar... indescritível.
Mas o que esses terapeutas disseram, dentro desse cenário paradisíaco, é que você é responsável por tudo o que acontece na sua vida. Nenhuma novidade, hoje em dia, exceto pelo fato de que essa idéia tão importante e crucial para a vida foi banalizada de mil maneiras e por mil livros de auto-ajuda cujo propósito principal era apenas vender... No entanto, se você realmente prestar atenção, aí está a chave para o que se convencionou chamar de “poder pessoal”. Vou abolir essa expressão neste texto, por total antipatia... poderíamos chamar de “capacidade de mudar a própria vida”.
Pois bem, a capacidade de mudar a própria vida está em assumir a hipótese operacional — portanto prática — de que tudo o que acontece na sua vida tem a sua participação. Mas e se alguém abusa de você, pesa, faz de você gato e sapato? Bem, de alguma maneira, maneira crucial, você está permitindo isso... o que você faz que permite que isso aconteça? Talvez não dê a importância devida a certos fatos ou atitudes... talvez “ganhe” algo com isso, lucre algum tempo para não enfrentar uma decisão difícil... talvez se beneficie de algum modo do papel de vítima... mas não há como escapar da responsabilidade por si próprio, e até mesmo por aquilo que você permite que os outros façam a você. Pelo contrário, assumir essa responsabilidade é que traz a força para mudar. Enquanto pensamos que os outros são culpados, estamos não fazendo nada com a força que nós próprios temos... e é certo que se você buscar dentro de si certamente encontrará algum recurso de que poderá lançar mão para superar uma situação difícil.
E mais ainda. Um amigo querido me disse algo muito significativo. Ele passa por um momento meio conturbado e comentou que, a partir de certa reflexão, conseguiu enxergar a luz no fim do túnel. “Se eu fizer isso, colocar-me desta maneira, conversar com fulano e sicrana, posso encaminhar a situação de modo que em uns meses ou em um ano a coisa já estará bem...”. O que ele disse de significativo foi que ao ver a luz no fim do túnel, lá na frente, o presente, agora, já se iluminou... Que passou a trabalhar com mais vontade, com melhores resultados, mais tranqüilo com a família... a luz que era lá na frente, já é aqui, agora. Este aqui e agora, bem cuidado, é o seu poder pessoal, ou a sua capacidade de mudar a própria vida. O tempo, na verdade, no absoluto, não existe. Ou, como dizia meu pai, “se você está procurando deus, é porque já o encontrou”...