20/07/2006
São Paulo é grande, mas mesmo assim nascemos no mesmo bairro, com três ruas nos separando. Escolas existem milhares, Vera Cruz só um. Crescemos sob a mesma batuta maestrina. Depois de tudo, ser do mesmo clube foi encarado com certa naturalidade. E não pára aqui mesma escolinha de futebol, mesma base, mesma preparação ideológica, mesma condição contra o passivismo e mesma paixão pelo tricolor paulista. Mas mesmo assim, mesmo com tantos mesmos, a amizade não iria brotar sem água.
O que na verdade aconteceu foi erva daninha, joio e cravo sem rosa. Incrível, mas tudo era uma eterna disputa, uma guerra dos cem anos ou até o primeiro se cansar.
Desavenças futebolísticas não faltavam e ele insistia em me chamar de Rei do Teletubies. (Não sei porquê, mas isso realmente me ofendia!) Lembro com perfeição detalhista os sermões da minha mãe nos levando de volta ao mesmo bairro, a três ruas de distância...
Porém, não há guerra nem mal que dure mais de um século e o ralo trigo refletido pelo sol começou a reluzir feito ouro... A primeira rama surgiu seguida de brotos e fauna.
As tardes intermináveis depois do mesmo curso de inglês, o nada para fazer compartido e as baguetes e Cocas da padaria Covadonga. Foi como se Israel e Palestina desistissem de lutar pela terra sagrada simplesmente porque ela é sagrada. Enfim, os mesmos venceram por insistência.
Anedotas mil e historias épicas pisadas sobre as mesmas três ruas. Rimos juntos do tempo que passou... Foi em sua casa que a vida se apresentou de um outro ângulo para mim. Foi nessa mesma casa em que eu comemorei minha primeira vitória política e uma pessoal também... Se bem que a pessoal teve mais cara de empate, mas isso não importa, o que vale são os três pontos...
O primeiro samba e a vela nunca mais se apagou. Se minha janela falasse, creio que não seria muito educada. Idéias de jerico se multiplicavam feito bactéria. E daí que eu tenho uma queimadura de segundo grau de óleo no braço... Primeiro a gente limpa a cozinha para não deixar pistas, mas impossível, a inspetora, minha mãe, sempre encontrou a massa em nossas mãos. Quase sempre, diga-se de passagem. E digo mais, continuaria com essa sessão nostalgia se eu fosse contista, mas sou crônico, sou direto ao grão, me chamo sem mais delongas...
Hoje faz exatos seis meses que o mesmo Ítalo me acompanhou até em casa no mesmo caminho, voltando da mesma Vila Madalena de sempre. Levou-me até a porta para dizer um até logo meio tímido, me abraçou e diferente de mim não chorou. Por fora não!
Hoje eu o espero aqui em Barcelona para cinco dias atemporais na vida dos dois e da nossa amizade, consumada desde a primeira colheita...
Minha mãe disse que teme pela Europa, por precauçao já deixei avisado os continentes mais próximos...
Agora eu levanto a taça e por muitos mesmos que virão e até mesmo que os que não, peço um brinde e agradeço, simplesmente pela colheita de cada dia ser sagrada...